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Um brasileiro dos Bálcãs

Vestindo uma camiseta branca, bermuda e chinelos, Petković nos atendeu em sua própria casa durante uma impiedosa manhã do verão carioca. Deixou-nos na sala de estar para que preparássemos os equipamentos e desapareceu. Minutos depois, enquanto ainda nos acomodávamos, Dejan voltou trajando uma bela camisa azul, combinada com uma calça e sapatos brancos.

Deixamos de lado os gols olímpicos e falamos sobre sua relação com o Brasil, com a Sérvia e até mesmo com o Kosovo. Ignoramos os gols de falta para falar da FIFA e da CBF. Durante toda a conversa nada escapou da análise do ex-jogador, que possui formação da Real Federación Española de Fútbol para atuar como diretor esportivo. Repousando seu olhar crítico sobre as mais diversas vertentes do futebol, Dejan acredita que o que acontece dentro de campo é apenas a ponta do iceberg.

Em comparação com o país onde você desembarcou há quase vinte anos, para jogar no Vitória-BA, que tipo de mudanças você vê?

Mudanças sempre existem, mas nem sempre são aquelas que gostaríamos de ver. É um país maravilhoso com potencial para mudar muito mais e muito mais rápido. O Brasil tem mais de quinhentos anos de história, mas está atrasado. As mudanças aqui acontecem numa escala bem mais lenta. Aqui há riquezas naturais e não vejo problemas étnicos, portanto, poderia crescer muito mais. Digo isso em comparação com meu país, embora não seja apropriado comparar o Brasil com a Sérvia.

O ano de 2013 foi marcado por diversas manifestações populares durante a Copa das Confederações. Como você viu esse movimento?

Em qualquer movimento de massa existem coisas por trás. Logicamente, o povo foi às ruas porque não foram cumpridas as promessas de que uma Copa do Mundo traria mudanças estruturais e melhorias na saúde e educação, que realmente carecem de atenção aqui no Brasil. Foi vendida uma ideia que não poderia ser atingida. Como em qualquer campanha política, vale tudo para conseguir, para ganhar. Depois se vê o que pode ser feito ou não.

Uma sanção política imposta sobre o futebol iugoslavo impediu que a seleção disputasse a Euro ’92. Você acha que a intervenção esportiva fazia sentido?

Embargo no esporte faz sentido? Não faz sentido. Nenhum. Era preciso ser uma decisão unânime da ONU, e não foi. Foi uma decisão da OTAN. Em 1999 aconteceu uma série de bombardeios da OTAN mesmo com o veto dos países membros da ONU. Há coisas no mundo que só funcionam pela vontade política de algumas partes envolvidas.

Foi justamente a magnífica geração do Estrela Vermelha de Mihajlović, Savićević, Prosinečki e Jugović que foi prejudicada pelo embargo. Você chega imediatamente após o título mundial conquistado pelo clube. Como foi isso?

Eu chego em 1992. Tinha ofertas para sair, mas eu era torcedor do Estrela Vermelha. Mesmo com aquele absurdo embargo que aconteceu, em vez de sair do país para poder crescer mais e desenvolver meu talento, eu permaneci na Iugoslávia. Eu iria para a Euro ’92. Perdi uma grande vitrine para mostrar meu talento. Mesmo assim, consegui ir para o Real Madrid depois de três anos no clube.

Ivanović, Kolarov, Matić, Marković, Ljajić, Kuzmanović… Como você avalia os jogadores sérvios de hoje? É possível o surgimento de uma geração tão talentosa como aquela de 1992?

É possível, mas existem questões óbvias que têm influência direta no futebol. Hoje, na Sérvia, temos um mercado de sete milhões de pessoas. Então, fica limitado para a ativação de marcas, patrocínios e publicidade. Logo, temos menos dinheiro. Se há menos dinheiro, temos menos qualidade na competição interna. Você não consegue montar um time de qualidade para jogar uma Liga Europa ou Champions League. É discrepante o dinheiro investido no meu país com relação a outros países europeus que têm mercado de trinta, quarenta ou cinqüenta milhões de pessoas. Há muito mais dinheiro envolvido. Com a diminuição da antiga Iugoslávia, ficou ainda mais difícil. Havia 24 milhões de habitantes: um mercado que poderia gerar mais dinheiro e uma liga mais forte para gerar jogadores fortes. Do jeito que está, o jogador tem que sair muito jovem para poder desenvolver sua qualidade e talento. Matic, Ljajic e Lazar Markovic saíram muito cedo. Não fizeram quase nada na Sérvia.

O Brasil é um país que você adotou e até a camisa da Seleção você já vestiu num amistoso. Você chegou até mesmo a torcer pelo Brasil na Copa. Você se sente brasileiro?

Claro, cem por cento! Sempre torci para o Brasil desde a minha chegada. Antes eu admirava a qualidade do futebol brasileiro. Mas depois que o Brasil virou a minha casa… Eu sempre brinco que, exceto na última Copa, sempre ganhou uma seleção para a qual eu torcia. Torço pela Sérvia e pelo Brasil, é óbvio o por quê. Torço pela Espanha e pela Itália porque uma filha nasceu num país e a outra filha nasceu no outro. De 2002 a 2010, eu ganhei todas as Copas.

E o 7 a 1? Quando você jogava, já teve essa sensação de não entender o que aconteceu durante um jogo?

Eu sei o que aconteceu com o time. O Brasil não vinha jogando um bom futebol durante a Copa. Estava jogando um futebol pobre, embora tivesse bons jogadores. A filosofia e conceito brasileiro estão defasados. A derrota foi contra um time muito organizado, com um conceito bem determinado; modelo de jogo, mecanismos e sistemas fáceis de reconhecer ao assistir. Sete a um foi um resultado muito desagradável, muito elástico. Mas, se me perguntassem quanto seria o jogo, diria que o Brasil perderia por três ou quatro, pelo futebol que vinha apresentando.

Brasil e Croácia se enfrentaram na última Copa do Mundo, assim como em 2006. Qual o sentimento com relação a um país dissidente da Iugoslávia?

Eu nunca fui nacionalista. Eu tenho amigos croatas e a gente lamenta a situação que aconteceu no meu país, a divisão da antiga Iugoslávia. Então, um nômade como eu, que já viajou e morou em vários países, sabe que nesse mundo tem muito mais gente boa do que ruim. E o que acontece é coisa política, de interesse econômico e, infelizmente, morreu muita gente inocente de todos os lados. Por isso me dou bem com todos. Tenho amigos croatas e bósnios, tanto como inimigos sérvios. Ainda assim, logicamente, quando a Croácia jogou com o Brasil, eu torci pro Brasil. São prioridades. Mas desde a pré-estreia na Copa, contra a própria Sérvia, o Brasil não jogou bem. Nem na estreia. Ganhou da Croácia sem merecer. A Croácia foi bem naquele jogo, mas não deu sorte.

Você acredita na legitimidade da autodeclaração de independência do Kosovo?

Não tem legitimidade nenhuma. Quando se fala no País Basco ou na Catalunha, tratam como impossível a independência, porque não há interesses de terceiros. No caso do Kosovo, não tem legitimidade. O território do Kosovo é um berço da história da Sérvia, independente da situação atual. A Constituição da Sérvia não admite uma independência forçada.

E teve também o episódio do drone* na partida entre Albânia e Sérvia…

Quando acontecem conflitos e guerras, sempre tem muita coisa suja. Nunca há só um lado que faz as coisas erradas. Sempre tem dois ou três lados, dependendo do conflito. Mas aquele drone foi um insulto não só à Sérvia, mas ao mundo inteiro. O irmão do primeiro-ministro da Albânia entra com passaporte americano, faz aquilo, bota uma bandeira da Grande Albânia – que não existe e ainda reivindica territórios da Grécia, da Macedônia, de não sei quê – e você ainda tem que liberar o cara? Só porque tem um passaporte americano? Os cidadãos americanos são os ursos polares do mundo no sentido de proteção [risos], então você não pode tocar neles. Aí vai fazer o quê? Reação de quê? Então dá pra ver que, no mundo, há alguma coisa muito ruim por trás, além de briga por consumo. Não é só consumo. O problema é que hoje em dia alguns países e religiões querem alguma coisa a mais do que o próprio direito de se expressar.

A guerra da Bósnia teve alguma influência na sua ida para o Real Madrid?

Não, não teve nada disso. A guerra da Bósnia praticamente acabou em 1994, já estava dividida quando eu fui pro Real Madrid. O embargo já tinha acabado. Eu fui para a Espanha em dezembro de 1995. Já não havia mais guerra.

E como foi sua chegada à Espanha?

Foi muito boa. Eu tinha que ir em agosto, mas o Estrela Vermelha não deixou porque, com o fim do embargo, pudemos voltar a disputar jogos internacionais. Como campeões da Iugoslávia, tínhamos um jogo eliminatório contra um time suíço para tentar entrar na Liga dos Campeões. O Estrela Vermelha conseguiu um acordo pra não me deixar sair em agosto, para que eu pudesse jogar a partida e ir em dezembro para o Real Madrid. Infelizmente, nós perdemos o jogo. Acabei ficando mais seis meses em Belgrado em vão. Quando cheguei, o Real Madrid já tinha contratado outro cara para o meu lugar, que era o Freddy Rincón. Quem me contratou foi o presidente Lorenzo Sanz, mas o treinador, Jorge Valdano, não me queria.

Na sua volta ao Flamengo em 2009, o Cuca também dificultou a sua incorporação ao time. Como você avalia a decisão do treinador naquele momento?

Não houve problemas com o Cuca. O departamento de futebol era contrário à minha contratação, não só o Cuca. O meu retorno ao Flamengo em 2009 se deu por questões financeiras. Eu estava na Justiça penhorando o patrimônio do clube e por isso abriram negociações, que duraram dois meses. Acredito que o departamento de futebol foi contra porque não havia sido consultado. Mas também pode ser porque o diretor do departamento [Kléber Leite] simplesmente não queria. A presidência, sim. A posição dos que eram a favor foi a seguinte: além de fazer um acordo financeiro, o clube contaria com um bom jogador, apesar do plantel de 31 atletas. A briga foi entre eles. Eu não estava nem aí para essa situação. Cheguei e o departamento de futebol teve que engolir, digamos, minha contratação. Mas eu já fui sabendo que poderia sofrer resistências lá dentro.

Sai o Cuca e o Andrade assume a equipe. Como ele contribuiu naquele momento?

Todo mundo teve sua contribuição. Eu cheguei lá e realmente eu era uma terceira opção. Não queriam contar comigo, mas me respeitaram como pessoa desde o primeiro dia. Depois aconteceu a mudança. O Cuca foi mandado embora. Houve várias reuniões e eu estava lá, como qualquer outro jogador do elenco e só ouvia. Como eu era recém-chegado e ainda contra a vontade de alguns, eu ficava só ouvindo. Não queria me meter para não parecer algo pessoal, ficava na minha. Decidiram mandar o Cuca embora, saiu a diretoria, saiu também a vice-presidência. O Andrade entrou como interino, querido por todos, um ex-craque e humilde. Queriam contratar outro treinador, e com a saída do departamento de futebol, eu comecei a ter a oportunidade de fazer praticamente tudo. Então eu pedi para continuarem com o Andrade. “Qual a diferença entre técnico efetivado e técnico interino? Em três ou quatro jogos você manda embora um ou outro de qualquer jeito se ele for mal. Então dá a chance pro Andrade, o pessoal gosta dele. Acho que vamos nos unir e, se não der certo depois de alguns jogos, você contrata outro treinador.” O Andrade, com toda a sua humildade, conseguiu unir o grupo. Nós nos fechamos e cada um teve sua importância.

Vira o ano, o Flamengo se transforma num caldeirão político e isso se reflete na demissão do Andrade…

Não foi bem assim. Nós ganhamos o título [Brasileiro de 2009], foi tudo maravilhoso e aí vieram mudanças políticas, presidente novo [Patrícia Amorim] e a demissão do então vice-presidente de futebol [Marcos Braz], que criou muita confusão. O Andrade, nesse momento, escolheu o lado errado. Ele ficou com o vice-presidente. Em uma determinada reunião, ele chegou atrasado junto com o já demitido vice de futebol. E isso culminou em sua própria demissão.

Por que você acha que o Andrade não conseguiu se firmar como treinador mesmo depois do título brasileiro?

É difícil dizer. O Andrade é gente muito boa, muito humilde. Entende do Futebol Arte porque jogou numa geração que praticava esse estilo. E ele tinha no grupo muitos aliados, além de mim. Eu ajudei muito o Andrade e vice-versa, porque ele bancou a minha importância dentro do time. Estávamos todos nos ajudando e, tudo o que a gente fazia e conversava, dava certo. A saída dele não foi a ideal e depois já não sei o que aconteceu. Sei que em algum momento ele teve um problema de saúde, foi para outros clubes e não deu certo, mas não sei o por quê.

Com tantos jogadores negros, não é curiosa para você a ausência de técnicos negros no futebol brasileiro? Você não acha que pode haver racismo?

Até há alguns, como o Cristóvão Borges, do Fluminense. Mas acho que não tem nada a ver com racismo, senão não haveria tantos jogadores negros. Não vejo por esse lado. Creio que é apenas uma questão de capacidade, formação, educação. Alguns têm, outros não. Não tem nada a ver.

Bruno e Adriano foram jogadores de enorme potencial desperdiçado. Poderiam ter sido titulares da Seleção na última Copa. O que você sente com relação a eles?

São dois casos totalmente diferentes e separados. O Adriano já foi o maior do mundo, já foi o Imperador… É uma pena que a vida particular dele tenha atrapalhado sua profissão. Ele é gente muito, muito boa. Conheço o Adriano e gosto dele. Mas ele só faz mal a ele mesmo. Uma pena. Ele poderia ter sido titular indiscutível nessa última Copa, como foi o Neymar. O Bruno talvez faria parte dessa Seleção porque tinha futuro como goleiro. Já havia times europeus interessados em contratá-lo. Era um bom goleiro. Infelizmente sua vida particular estragou um garoto que poderia virar, talvez, um goleiro de Seleção. A gente acreditava nisso.

Muitas vezes, a personalidade de um jogador é percebida de maneiras diferentes dentro e fora de campo. O que você pensa sobre isso?

As pessoas gostam de julgar. Ou você é vilão ou herói. Não é por aí. Independente disso, você é uma pessoa, um ser humano que tem suas coisas, seus costumes, sua essência, sua personalidade, sua profissão. Todo homem tem o direito de errar. Às vezes a gente quer julgar de 1 a 100 e não é assim. Acho que a personalidade e o perfil de qualquer indivíduo não podem ser muito distintos do lado profissional. Pode ser que você não esteja acostumado a ver a pessoa atuando em sua profissão. A gente não vai numa sala de cirurgia ver o médico operar. Já um músico, pianista, violinista, em um concerto, está focado apenas naquela coisa. Você vai lá, aplaude e não vê o dia a dia, não sabe como ele é. Quando você começa a ter as notícias todos os dias, começa a conhecer muito mais. Na vida particular, você casa e percebe “ah, não é isso”. Quando começa a dividir as coisas todos os dias, muda. Você tem um amigo muito querido, que quase nunca vê, e, quando vai passar férias com ele, começa a ver os defeitos. Somos todos cheios de virtudes e defeitos. Somos de carne e osso.

Houve outros jogadores sérvios que chegaram ao Brasil e não emplacaram. Você acha que o futebol brasileiro é receptivo a jogadores estrangeiros?

No meu caso, pensei assim: vou abrir o mercado para as pessoas do meu país. Mas parece que eu o fechei. Quando traziam outros jogadores, queriam que fossem iguais ao Pet. Não entenderam que eu não vim da Sérvia, eu vim do Real Madrid, do melhor clube do mundo. A minha qualidade já tinha sido comprovada, meu talento já era reconhecido. Agora, trazer jogador do campeonato sérvio e querer que ele seja igual a mim é muito pretensioso, muito ingênuo ou muito injusto. Não dá tempo de se adaptar. É uma mudança muito drástica. Eu tinha histórico, tinha currículo, seleção, título, talento… É outra cultura, outro país, outra família… Será que a cabeça dele já está suficientemente amadurecida pra ele brigar com as dificuldades daqui, no calor, na exigência, na pressão? Por essas coisas, ninguém se interessa. Não fez gol, não jogou bem.

O futebol brasileiro aprenderia com mais jogadores europeus?

Não aprende nem com os próprios jogadores que tem aqui. Desperdiça, joga fora depois de dois jogos. Se um moleque de vinte anos entrou no time, deitou e rolou num jogo, já é um fenômeno. Depois de dois jogos, pisou três vezes na bola e já não presta para nada. Não tem planejamento. O jogador não está sendo bem tratado, lapidado. É preciso dar oportunidades, ensinar, formar, aprimorar… Tem muita coisa. O Brasil tem talentos, só que o talento tem que ser trabalhado. O talento, para virar sucesso, depende de horas e horas de trabalho. Além disso, precisa-se de professores excelentes.

O ex-jogador Luís Figo candidatou-se oficialmente à presidência da FIFA. Como você vê a possibilidade de a entidade ser administrada por alguém que seja mais do jogo e menos da política?

Nós já temos a presença de um ex-jogador: Michel Platini, por exemplo. A UEFA está muito bem organizada, muito mais que a FIFA, digamos. A FIFA está encarregada pelo futebol no mundo todo, mas não se mete aqui dentro [do Brasil]. Só se mete quando tem ações internacionais. A presença de ex-jogadores dentro de organizações e instituições tão importantes é sempre boa porque traz uma visão além dos interesses econômicos dos cartolas, então esse cara vai respeitar a profissão. Acho essencial a presença de pessoas como o Figo, um craque que passou por todas as bases, jogou em times grandes e já está envolvido lá dentro com os cartolas. Seria importante haver um alinhamento entre Michel Platini e Figo. Mas, se eles resolverem se combater, vai dar ruim [sic].

A CBF precisa de algo parecido? Um ex-jogador no comando?

A CBF precisa urgentemente. O futebol brasileiro precisa. Mas a CBF não quer. Ela quer autonomia. Ela é autoridade, ninguém vai tirar isso dela porque é federação. Isso serve para todas as federações. Na Europa, elas são responsáveis pela competição dentro do país, mas existem mais torneios para as seleções. Os clubes fazem parte de uma liga que organiza o futebol entre clubes. Então, se a CBF e as federações acumularem a organização de todas as competições, é muito trabalho.

A existência dos campeonatos estaduais está diretamente relacionada à estrutura política da CBF. Os presidentes das federações estaduais elegem o presidente da CBF. Você acha essa dinâmica maléfica para o desenvolvimento do futebol no Brasil?

Aqui nós temos democracia, autonomia. Então, cada campeonato, cada país, cada cultura são diferentes. Aqui nós temos os estaduais. Sou a favor da manutenção dos estaduais, mas não com o time principal. Bota o sub-23 pra jogar. O que a gente faz com os jogadores sub-20? Já que é pra manter os estaduais pela importância histórica, que se mantenha, mas que se jogue com um time sub-23. É onde você faria essa transição de um jogador do sub-20 para o primeiro time, porque nem todos podem entrar de cara numa competição de alto nível. Deveria existir um campeonato brasileiro sub-20 que durasse o ano todo e não somente duas semanas como aconteceu em 2013 e 2014. Como não há competições fortes, os jovens não estão sendo preparados para enfrentar uma competição internacional. É o que acontece no meu país também. A seleção brasileira sub-20 que disputou o sul-americano tem jogadores muito talentosos, mas, além de não terem conseguido bons resultados, eles sequer jogaram bem.

Você é conhecido no Brasil também por ser um cara diferenciado e suas entrevistas após os jogos costumavam fugir da mesmice. O futebol está preparado pra esse tipo de atleta como você, Paulo André e Alex, por exemplo?

Futebol brasileiro, né? Porque o futebol está preparado. O futebol brasileiro, não. Ainda tem muita resistência. Eu pensava que haveria alguma mudança drástica às vésperas da Copa do Mundo e depois também. Não aconteceu nada, temos resistência. São poucos os jogadores e ex-jogadores preparados para essas funções. De um lado temos uma cultura de longo tempo em que o cartola é quem manda no futebol. Por outro lado, os jogadores nunca foram preparados pra isso e recentemente vi alguns jogadores que são mais formados, têm cabeça e têm perfil de quem poderia ocupar cargos como diretores, presidentes, gestores, porque isso falta no futebol brasileiro.

Você acha que o profissional de educação física pode treinar times?

Você termina a faculdade, mas teve qual matéria? Você é treinador de basquete, handebol, polo aquático ou futebol? Não quer dizer que você está preparado. Jogadores ou ex-jogadores levam vantagens pela experiência no vestiário, mas também precisam ser preparados. Nem todo mundo pode ser treinador. Lá na Europa, por exemplo, especificamente na federação espanhola de futebol, que organiza cursos de diretor esportivo de futebol, não é admitido o cara que não tem ligação com o futebol, que nunca jogou nem nunca trabalhou em um clube. É preciso ter trabalhado num clube por no mínimo dez anos ou ser jogador federado no mínimo há dez anos pra poder entrar nesse curso de formação de diretor esportivo.

Você concorda com isso? Arrigo Sacchi e Mourinho nunca jogaram futebol.

Mas trabalharam quanto tempo? Não são só esses. Rafa Benítez não foi jogador. Mas os caras trabalharam, aprenderam e viveram. Não basta chegar e dizer: “Sou engenheiro, doutor em não sei o quê, tenho PhD, não sei mais o quê e quero ser um treinador”. Não é bem assim, apesar de que, no mercado competitivo de hoje em dia, se você, como um diretor, presidente ou dono de clube, quiser um cirurgião como técnico, fique à vontade. Resultados vão aparecer rápido.

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Jornalista, publicitário e fotógrafo. Estudou comunicação social na Universidad Nacional de La Plata. Para Martinho, não existe golaço de falta (nem aquele do Roberto Carlos em 1997 contra a França ou de Petković em 2001 contra o Vasco). Aos 11 anos, deixou o cabelo crescer por causa do Maldini. Boicota o acordo ortográfico.

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